quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Asa de Borboleta _ Cecília Meireles

No mistério do sem-fim

equilibra-se um planeta.

E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro;
no canteiro uma violeta,

e, sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o sem-fim,
a asa de uma borboleta.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Antes de um lugar há o seu nome_Maria Rosário Pedreira

Antes de um lugar há o seu nome. E ainda

a viagem até ele, que é um outro lugar

mais descontínuo e inominável.


Lembro-me

do quadriculado verde das colinas,

do sol entretido pelos telhados ao longe,

dos rebanhos empurrados nos carreiros,

de um cão pequeno que se atreveu à estrada.


Íamos ou vínhamos?

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A Mãe _ João Negreiros


A mãe

Quando crescer quero ser a mãe

só p’ra ser a minha

e me dar carinho sem ter que mo pedir

quero morrer p’ra ser a mãe de alguém

mas com as mãos a voz e o cheiro da minha



mãe

és a minha mãe

antes não fosses

antes fosses a mãe de todos

p’ra que todos fossem felizes

se fosses a mãe do mundo o mundo era melhor

e eu não existia

mas acredita que não me importava

porque haveria de viver no som dos teus beijos

no fresco da tua mão contra a testa febril

no olhar que encontra o brinquedo

na luz que me apaga o medo



haveria de viver no teu coração como um filho que não nasceu

e que morre todos os dias para provar que sempre te amou



in "o cheiro da sombra das flores"

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

A Defesa do Poeta _ Natália Correia

Senhores jurados sou um poeta

um multipétalo uivo um defeito

e ando com uma camisa de vento

ao contrário do esqueleto

Sou um vestíbulo do impossível um lápis

de armazenado espanto e por fim

com a paciência dos versos

espero viver dentro de mim

Sou em código o azul de todos

(curtido couro de cicatrizes)

uma avaria cantante

na maquineta dos felizes

Senhores banqueiros sois a cidade

o vosso enfarte serei

não há cidade sem o parque

do sono que vos roubei

Senhores professores que puseste

a prémio minha rara edição

de raptar-me em crianças que salvo

do incêndio da vossa lição

Senhores tiranos que do baralho

de em pó volverdes sois os reis

sou um poeta jogo-me aos dados

ganho as paisagens que não vereis

Senhores heróis até aos dentes

puro exercício de ninguém

minha cobardia é esperar-vos

umas estrofes mais além

Senhores três quatro cinco e sete

que medo vos pôs na ordem ?

que pavor fechou o leque

da vossa diferença enquanto homem ?

Senhores juízes que não molhais

a pena na tinta da natureza

não apedrejeis meu pássaro

sem que ele cante minha defesa

Sou uma impudência a mesa posta

de um verso onde o possa escrever

ó subalimentados do sonho !

a poesia é para comer.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Hoje sorriem-me a terra e os céus _Gustavo Adolfo Bécquer



Hoje sorriem-me a terra e os céus;

sinto no fundo da minha alma o sol;

eu hoje vi-a..., vi-a e ela olhou-me...

Creio hoje em Deus!

Ama-me...Incondicionalmente _ Dr.Jeckyl.


"Ama-me quando eu menos o merecer,
porque será nessa altura que mais necessitarei"

- Dr.Jeckyl.











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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

O cair das Máscaras__Menina do Alto da Serra


Caiu o pano, cairam as máscaras...
repetes algures o enredo desta peça
que escreveste um dia, encenaste, representas e
que tens em permanente exibição,
mantendo o mesmo elenco bolorento,
com excepção da primeira figura
feminina.

Porque precisas dela para sobreviver,
dos afectos, das atenções
que alimentas sem intenção
de guardar e velar,
Como bom Corsário
que és não sabes construír
apenas pilhar e roubar.

Vais, assim, assumindo em sucessivos e novos palcos,
o papel que se colou
ao teu rosto e alma,
entrando pela calada
da noite nos portos de abrigo
que encontras nesses mares
em que navegas,
conquistando com o teu eterno queixume e
lamento, música e falsas doçuras,
os corações das recatadas donzelas
que te devotam palavras de ânimo e
puro afecto e, envoltas numa cega ilusão,
cheias de pena pelas tuas (falsas) penas,
juram resgatar-te da escuridão
e conduzir-te à luz que finges querer alcançar...

Tudo levas que te alimente o ego, nada dás em troca além
de choro e crueldade
e partes, não como vieste,
mas deixando bem presente o teu lastro de destruição,
nas casas incendiadas, nas donzelas violentadas,
no choro desenfreado,
nas louças partidas e livros rasgados pelo chão,
fruto da tua acção malvada.