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domingo, 12 de dezembro de 2010

PRELÚDIOS-INTENSOS PARA OS DESMEMORIADOS DO AMOR, II - Hilda Hist

Tateio. A fronte. O braço. O ombro.
O fundo sortilégio da omoplata.
Matéria-menina a tua fronte e eu
Madurez, ausência nos teus claros
Guardados.

Ai, ai de mim. Enquanto caminhas
Em lúcida altivez, eu já sou o passado.
Esta fronte que é minha, prodigiosa
De núpcias e caminho
É tão diversa da tua fronte descuidada.

Tateio. E a um só tempo vivo
E vou morrendo. Entre terra e água
Meu existir anfíbio. Passeia
Sobre mim, amor, e colhe o que me resta:
Noturno girassol. Rama secreta.

sábado, 11 de setembro de 2010

De tanto te pensar - Hilda Hilst




De tanto te pensar, me veio a ilusão.

A mesma ilusão

Da égua que sorve a água pensando sorver a lua.

De te pensar me deito nas aguadas

E acredito luzir e estar atada

Ao fulgor do costado de um negro cavalo de cem luas.

De te sonhar, tenho nada,

Mas acredito em mim o ouro e o mundo.

De te amar, possuída de ossos e abismos

Acredito ter carne e vadiar

Ao redor dos teus cismos. De nunca te tocar

Tocando os outros

Acredito ter mãos, acredito ter boca

Quando só tenho patas e focinho.

De muito desejar altura e eternidade

Me vem a fantasia de que Existo e Sou.

Quando sou nada: égua fantasmagórica

Sorvendo a lua n'água.

sábado, 4 de setembro de 2010

Para que tu vivas - Hilda Hilst




Para poder morrer

Guardo insultos e agulhas

Entre as sedas do luto.

Para poder morrer

Desarmo as armadilhas

Me estendo entre as paredes

Derruídas

Para poder morrer

Visto as cambraias

E apascento os olhos

Para novas vidas

Para poder morrer apetecida

Me cubro de promessas

Da memória.

Porque assim é preciso

Para que tu vivas.

sábado, 21 de agosto de 2010

Poema V, A Frederico García Lorca _ Hilda Hilst


















Companheiro, morto desassombrado, rosácea ensolarada

quem senão eu, te cantará primeiro. Quem senão eu

pontilhada de chagas, eu que tanto te amei, eu

que bebi na tua boca a fúria de umas águas

eu, que mastiguei tuas conquistas e que depois chorei

porque dizias: “amor de mis entrañas, viva muerte”.

Ah! Se soubesses como ficou difícil a Poesia.

Triste garganta o nosso tempo, TRISTE TRISTE.

E mais um tempo, nem será lícito ao poeta ter memória

e cantar de repente: “os arados van e vên

dende a Santiago a Belén”.



Os cardos, companheiro, a aspereza, o luto

a tua morte outra vez, a nossa morte, assim o mundo:

deglutindo a palavra cada vez e cada vez mais fundo.

Que dor de te saber tão morto. Alguns dirão:

Mas se está vivo, não vês? Está vivo! Se todos o celebram

Se tu cantas! ESTÁS MORTO. Sabes por quê?


“El passado se pone

su coraza de hierro

y tapa sus oídos

con algodón del viento.

Nunca podrá arrancársele

un secreto.”


E o futuro é de sangue, de aço, de vaidade. E vermelhos

azuis, braços e amarelos hão de gritar: morte aos poetas!

Morte a todos aqueles de lúcidas artérias, tatuados

de infância, de plexo aberto, exposto aos lobos. Irmão.

Companheiro. Que dor de te saber tão morto.




In,  "Poemas aos homens de nosso tempo”.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Colada à tua boca a minha desordem.

















" Colada à tua boca a minha desordem.

O meu vasto querer.

O incompossível se fazendo ordem.

...Colada a tua boca, mas descomedida

Árdua

Construtor de ilusões examino-te sôfrega

Como se fosses morrer colado à minha boca.

Como se fosse nascer

E tu fosses o dia magnânimo

Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer."

domingo, 25 de julho de 2010

Poemas aos Homens do nosso Tempo - IX














Ao teu encontro, Homem do meu tempo,

E à espera de que tu prevaleças

À rosácea de fogo, ao ódio, às guerras,

Te cantarei infinitamente à espera de que um dia te conheças

E convides o poeta e a todos esses amantes da palavra, e os outros,

Alquimistas, a se sentarem contigo à tua mesa.

As coisas serão simples e redondas, justas. Te cantarei

Minha própria rudeza e o difícil de antes,

Aparências, o amor dilacerado dos homens

Meu próprio amor que é o teu

O mistério dos rios, da terra, da semente.

Te cantarei Aquele que me fez poeta e que me prometeu

Compaixão e ternura e paz na Terra

Se ainda encontrasse em ti, o que te deu.