quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

manuel 6 vezes pensei em ti _ Àlamo de Oliveira



Manuel
quando pensei em ti     pella primeira vez 
usavas um bibi de sorrisos
atado com dois laços incertos
quase sempre rôtos e sujos
porque a tua mãe não ganhava para sabão.

quando pensei em ti pela segunda vez
vi-te correr suspenso a uma borboleta
ainda nu de preconceitos
com calções de ideias curtas
sem dúvidas nem venenos
eras a verdade dos pássaros
na tua liberdade que desconhecias.

quando pensei em ti    pela  terceira vez
já tinhas mastigado a terra dos milhos
sugado     com a ponta da inteligência
o teu suor dos outros
num cálice talhado de rocha negra
banhavas o cérebro e os desejos
num avião da pan america.
começavas a sentir a ilha no pescoço
como uma coleira de cão.

quando pensei em ti     pela quarta vez
eras o contrário do movimento.
Um sexo enorme devorava-te    manuel,
e a tua adolescêmcia ultrapassada
estava resumida nas tuas galças de ganga
e numa camisa despovoada
que ratinhos inconformados ruminavam
até te espetares na margarida
- uma flor que nem sequer tem espinhos
os teus pés descalços eram o retrato do teu povo.


o cordão umbilical do teu casamento.
a ilha era a tua cama (e a dos outros)
e tu tinhsa a consciência de que eras incapaz
de desflorar a margarida
na tua ilha de parasitas e insectos
na tua ilha sebenta e recheada de pobres
-de pele e de espírito -
como tu e como eu e como...
como o nosso deus feito ilhéu.

quando pensei em ti    pela última vez
tinhas três filhos gerados nos teus olhos
e un cacho de esperanças murchas
pendurado no alpendre da tua fantasia.

manuel
o melhor é nem pensar
nos rebuçados que não comeste na infância.          

In "Triste Vida Leva a Garça"