quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Poema das Coisas - António Gedeão















Amo o espaço e o lugar, e as coisas que não falam.

O estar ali, o ser de certo modo,

o saber-se como é, onde é que está e como,

o aguardar sem pressa, e atender-nos

da forma necessária.



Serenas em si mesmas, sempre iguais a si próprias,

esperam as coisas que o desespero as busque.



Abre-se a porta e o próprio ar nos fala.

As cortinas de rede, exactamente aquelas,

a cadeira onde a memória está sentada,

a mesa, o copo, a chávena, o relógio,

o móvel onde alguém permanece encostado

sem volume e sem tempo,

nós próprios, quando os olhos indignados

nas pálpebras se encobrem.



Põe-se a pedra na mão, e a pedra pesa,

pesa connosco, forma um corpo inteiro



Fecha-se a mão, e a mão toma-lhe a forma,

conhece a pedra, entende-lhe o feitio,

sente-a macia ou áspera, e sabe em que lugares.

Abre-se a mão, e a mesma pedra avulta.



Se fosse o amor dos homens

quando se abrisse a mão já lá não estava.