quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Calçada de Carriche - António Gedeão

 No aniversário do Nascimento do Poeta ((Rómulo Carvalho)


Luísa sobe, sobe a calçada,


sobe e não pode que vai cansada.



Sobe, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe sobe a calçada.



Saiu de casa

de madrugada;

regressa a casa

é já noite fechada.

Na mão grosseira,

de pele queimada,

leva a lancheira

desengonçada.



Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.



Luísa é nova,

desenxovalhada,

tem perna gorda,

bem torneada.

Ferve-lhe o sangue

de afogueada;

saltam-lhe os peitos

na caminhada.



Anda, Luísa. Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.



Passam magalas,

rapaziada,

palpam-lhe as coxas

não dá por nada.



Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.



Chegou a casa

não disse nada.

Pegou na filha,

deu-lhe a mamada;

bebeu a sopa

numa golada;

lavou a loiça,

varreu a escada;

deu jeito à casa

desarranjada;

coseu a roupa

já remendada;

despiu-se à pressa,

desinteressada;

caiu na cama

de uma assentada;

chegou o homem,

viu-a deitada;

serviu-se dela,

não deu por nada.



Anda, Luísa. Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.



Na manhã débil,

sem alvorada,

salta da cama,

desembestada;

puxa da filha,

dá-lhe a mamada;

veste-se à pressa,

desengonçada;

anda, ciranda,

desaustinada;

range o soalho

a cada passada,

salta para a rua,

corre açodada,

galga o passeio,

desce o passeio,

desce a calçada,

chega à oficina

à hora marcada,

puxa que puxa, larga que larga,[x 4]

toca a sineta

na hora aprazada,

corre à cantina,

volta à toada,

puxa que puxa, larga que larga,[x 4]



Regressa a casa

é já noite fechada.

Luísa arqueja

pela calçada.



Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada, [x 3]



Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada